O presidente Jair Bolsonaro assinou ontem a Medida Provisória (MP) do Contribuinte Legal, que dá base para acordos entre a administração tributária e contribuintes devedores, com descontos e parcelamentos. Com isso, a expectativa do governo é limpar o estoque de litígios e engordar a arrecadação em pelo menos R$ 5,5 bilhões em 2020. 

A cifra pode chegar a R$ 7 bilhões, como informado pelo Valor ontem, se o governo optar por concentrar os pagamentos a partir de janeiro de 2020. Existe outra possibilidade em análise, que é fechar acordos ainda neste ano, com uma parcela de entrada. Em 2021, são esperados R$ 5 bilhões e, em 2022, R$ 4,4 bilhões, informou o secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues. "São cálculos conservadores", disse. 

A MP integra um conjunto de propostas que o Ministério da Economia prepara para recompor R$ 89 bilhões em despesas discricionárias na proposta do Orçamento do ano que vem. Também integra esse pacote a MP que acaba com o adicional de 10% da multa do FGTS. 

Com a MP anunciada ontem, o governo regulamenta o instituto da transação tributária, previsto no Código Tributário Nacional, de 1966. Serão permitidos acordos para créditos de difícil recuperação e para pacificar controvérsias relevantes e disseminadas que não tenham sido objeto de decisão da Justiça. 

Discursando no Palácio do Planalto ao lado do presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, Bolsonaro ressaltou que, ao facilitar a relação com o Fisco, a MP pode ajudar o empreendedorismo. "Por que não está dentro do povo querer ser patrão, empreendedor? Porque talvez as pessoas saibam da dificuldade que é ser patrão no Brasil", disse. 

Os créditos de difícil recuperação, classificados como C e D no ranking da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) somam R$ 1,4 trilhão e envolvem 1,9 milhão de contribuintes não localizados, empresas sem patrimônio, sem produção e as que estão em recuperação judicial. Para esse grupo, os descontos são de até 70% sobre a dívida total, aplicada somente aos juros e multas. 

"Tem de ter uma abordagem agressiva", disse o procurador-geral da Fazenda Nacional, José Levi. "O que recuperar, está valendo." 

Um edital estabelecendo o perfil das dívidas a serem atendidas pelo programa está praticamente pronto. No entanto, existe a possibilidade de o governo iniciar negociações de imediato. Por exemplo, com as empresas em recuperação judicial. Segundo Levi, essas poderão ser um "laboratório" seguro e controlado para testar a transação. 

A MP autoriza acordos também para encerrar contenciosos nas esferas administrativa e judicial. Só no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), há R$ 600 bilhões em discussões passíveis de serem enquadradas. Há outros R$ 40 bilhões em créditos que são garantidos por seguro ou caução. 

Nessa parte do programa, o governo deverá escolher uma tese e propor acordo por meio de edital. O contribuinte pode ou não aderir. 

Levi não adiantou qual será a primeira controvérsia a ser objeto de transação. Mas um bom candidato é o cálculo do PIS/Cofins após a decisão do Supremo de retirar o ICMS de sua base de cálculo. 

"Acho positivo, pois estamos há 50 anos esperando a regulamentação da transação tributária", disse a advogada Lígia Regini, sócia do escritório BMA. Para ela, a regulamentação deve dar clareza aos critérios de enquadramento das dívidas. "O impacto da MP é enorme", afirmou  Filipe Richter, sócio do Veirano Advogados. "A lei deve trazer limites, até onde o poder público pode abrir mão, porque senão vira bagunça e palco para a corrupção." 

A transação tributária não pode ser comparada ao Refis, "comprovadamente ineficiente", segundo Levi. Na mais recente edição, 90% dos contribuintes tinham dívidas classificadas como A ou B. Ou seja, recuperáveis, mas os contribuintes em pior situação, com dívidas C ou D, não conseguiram obter o parcelamento.

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