Direito da Concorrência

As autoridades de concorrência ao redor do mundo elegeram um novo alvo de investigações: os acordos de não contratação (no-poaching agreements) e os acordos sobre valores/componentes da remuneração de funcionários (wage-fixing agreements). E a tendência é que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) comece a examinar os impactos antitruste desses acordos no Brasil.

A discussão pela comunidade internacional é cada vez mais frequente, como visto em conhecidos eventos da área, como o Antitrust Spring Meeting da American Bar Association e o GCR Live Annual Cartels, realizados em março de 2019, em Washington DC, que contaram com a participação dos sócios da área de Antitruste de TozziniFreire e no recente paper divulgado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) denominado Competition Concerns in Labour Markerts – Background Note.

De fato, os acordos entre empregadores com o intuito de limitar contratações entre empresas ou fixar salários/benefícios têm ganhado cada vez mais espaço na agenda das autoridades de defesa da concorrência. O pioneirismo coube às autoridades norte-americanas, que em 2016 emitiram um guia voltado para os profissionais da área de Recursos Humanos (o Guia), cujo objetivo é alertar sobre possíveis violações antitruste nessa seara.

De acordo com o Guia, acordos entre empregadores com o objetivo de (i) limitar e/ou fixar salários ou outros termos que englobam a remuneração, ou (ii) não aceitar e/ou não permitir a contratação de funcionários de outra(s) empresa(s) poderão ser considerados ilícitos por objeto (per se) à luz da legislação antitruste norte-americana e, portanto, passíveis de responsabilidade criminal naquele país. Por outro lado, os acordos de não contratação acessórios a operações societárias (e.g., a criação de joint ventures) ou decorrentes de relações verticais (e.g., franquias) poderão ser analisados pela regra da razão, de modo que a potencial ilicitude dependerá do balanço entre as justificativas/racionalidade econômica da prática e seus reais ou potenciais efeitos anticompetitivos no mercado.

Cumpre salientar que, de acordo com o próprio Guia, sob a perspectiva antitruste, empresas que competem para contratar e reter funcionários são concorrentes no mercado de trabalho como um todo, independentemente se ofertam os mesmos produtos ou serviços.

Nos últimos anos, diversas empresas foram investigadas nos Estados Unidos, tais como na investigação envolvendo as empresas Adobe, Apple, Google, Intel Intuit e Pixar, e também investigação acerca das empresas Knorr-Bremse e a Wabtec, sendo que em ambos os casos as empresas celebraram acordos para cessar a prática. Mais recentemente, em março de 2019, foi noticiada uma investigação em diversos estados em relação a “acordos de não contratação” entre franquias e franqueados de quatro cadeias de fast-food (Dunkin’, Arby’s, Five Guys e Little Caesars) que também entraram em acordo com as autoridades para modificar seus respectivos contratos de franquia, retirando cláusulas que impedissem/obstassem as franqueadas de contratar funcionários de outras lojas da mesma franquia, o que impediria a mobilidade destes funcionários entre os franqueados concorrentes.

Outro ponto de destaque no Guia é a orientação de que a troca de informações sensíveis entre empresas acerca de temas da área de RH poderá vir a ser caracterizada como um ilícito antitruste, a depender do caso concreto. Isso porque, nesses casos, ainda que não haja um acordo explícito entre empregadores, a troca de informações sensíveis poderá gerar impactos negativos no mercado de trabalho.

No Brasil, ainda não há uma determinação expressa do CADE sobre o tema. Contudo, tendo em vista que o órgão se espelha nas melhores práticas adotadas por autoridades antitruste estrangeiras, sobretudo dos Estados Unidos e da Europa, certo é que esse tema já está no radar. Nesse sentido, como medida preventiva e/ou corretiva, é recomendável a adoção de medidas de compliance e treinamentos internos com vistas a alertar e salvaguardar as empresas e os profissionais de RH contra possíveis práticas que possam configurar condutas anticompetitivas, passíveis de multas (até 20% do faturamento bruto) e outras graves penalidades.

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