Uma invenção de seleção é aquela em que um único elemento ou um pequeno segmento dentro de um amplo grupo conhecido é selecionado e reivindicado de forma independente, com base em uma característica particular não mencionada no dito grupo mais amplo.

As patentes que utilizam uma fórmula Markush para reivindicar um composto são um dos exemplos mais usuais para ilustrar uma invenção de seleção na área química/farmacêutica. Uma fórmula Markush possui diversos radicais com inúmeras possibilidades de substituintes que podem ser escolhidos. As combinações de todas as possibilidades dos radicais podem proporcionar inúmeros compostos e parte deles não são nem estudados nem descritos no pedido de patente. Uma invenção de seleção consiste na seleção de substituintes específicos que proporcionam um composto diferente com propriedades surpreendentes em relação ao composto mais amplo do qual a seleção foi feita.

Um exemplo mais prático para ilustrar as invenções de seleção, é a seleção de parâmetros em um processo. Por exemplo, um processo utiliza uma faixa de temperatura entre 50 e 200 ºC e uma faixa de pressão entre 40 e 90 Pa e o rendimento dele é X. Foi verificado que o rendimento do processo triplicou usando uma temperatura de 58 ºC com uma pressão de 72 Pa, tais condições não foram testadas nem descritas no estado da técnica. Este processo com a seleção de condições específicas e o fornecimento de um resultado superior, também pode ser usado como um exemplo para as invenções de seleção.

A legislação brasileira não possui qualquer impedimento para a concessão de patentes para as invenções de seleção, e tais invenções devem ser analisadas perante os mesmos critérios de patenteabilidade das demais invenções, a saber: novidade, atividade inventiva e aplicação industrial.

Apesar de não haver qualquer distinção na lei brasileira quanto a este tipo de invenção, a patenteabilidade das invenções de seleção está cada vez mais sendo discutida. Essa discussão envolve principalmente questões relacionadas com a saúde pública e a economia, uma vez que grande parte das invenções de seleção está relacionada às patentes farmacêuticas.

Em março de 2015, o INPI disponibilizou para consulta pública uma proposta de diretrizes de exame de pedidos de patente que discute algumas condições que devem ser consideradas no exame de uma invenção de seleção e fornece algumas orientações para os examinadores seguirem ao examinar uma invenção deste tipo.

Dentre as principais orientações apresentadas nestas diretrizes, destacam-se a apresentação de conceitos para caracterizar uma seleção e o fornecimento de algumas situações exemplificativas para determinar se a seleção pode ser considerada óbvia ou não. De acordo com o entendimento do INPI refletido em tais diretrizes, a seleção deve representar uma invenção independente e/ou um novo ensinamento e não deve ser uma mera seleção arbitrária em relação ao estado da técnica, além disso, se um membro pontual do grupo mais amplo do qual a seleção foi originada já apresentar tal característica, a seleção não será provida de atividade inventiva.

Este documento reflete a preocupação e a importância que tal tema deve ser tratado pelo INPI, assim como também indica que o Brasil está caminhando de acordo com o entendimento de diversos escritórios de patentes no mundo, tais como, EPO, USPTO e JPO.

Atualmente, a dificuldade de criar uma nova molécula é extremamente grande, mesmo com os elevados investimentos em pesquisa, desenvolvimento e tecnologia. Com isso, muitas indústrias farmacêuticas estão investindo em invenções incrementais na tentativa de desenvolver a inovação no setor farmacêutico. As invenções de seleção, que são invenções incrementais, são uma alternativa real para o desenvolvimento de novos fármacos e têm sido bastante exploradas por essas indústrias.

O sistema de patente na área farmacêutica pode ser analisado por dois prismas, isto é, o primeiro em que a inovação favorece a criação de novas drogas e o segundo de que a proteção patentária de fármacos pode dificultar o acesso aos medicamentos. As invenções de seleção proporcionam um aumento de grande relevância na disponibilização de novos fármacos para a sociedade, mas por outro lado podem ser utilizadas como estratégia para a extensão da vigência da patente, que são os casos conhecidos como evergreening.

Considerando que as invenções de seleção protegem invenções novas e inventivas que são diferentes da patente originária e atendem a todos os requisitos para a concessão de uma patente estabelecidos por lei, não é coerente interpretar este tipo de patente como uma prorrogação do prazo de proteção da patente de origem.

No Brasil, o exame de patentes na área farmacêutica também é realizado pela ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). A concessão de uma patente farmacêutica requer a prévia anuência da ANVISA para, em seguida, ser examinada pelo INPI. Em geral, a ANVISA analisa os pedidos que são considerados de interesse para as políticas de medicamentos ou cuidados farmacêuticos do SUS (Sistema Único de Saúde).

Conforme estabelecido pela Procuradoria Geral Federal (PGF), em 16 de outubro de 2009, as atribuições institucionais do INPI e da ANVISA são específicas e próprias, e não devem ser confundidas ou mesmo sobrepostas. A PGF concluiu que não é atribuição da ANVISA promover, por ocasião do exame de anuência prévia, análise baseada nos critérios de patenteabilidade, uma vez que essa seria uma atribuição própria e única do INPI. Além disso, a PGF estabeleceu que a ANVISA deve, na análise da anuência prévia, atuar nos limites de sua competência, ou seja, orientada para impedir a produção e a comercialização de produtos e serviços potencialmente nocivos à saúde humana. O entendimento da PGF também foi adotado por diversos órgãos públicos, como os Tribunais Regionais Federais da 1ª e 2ª regiões, o Ministério Público e as Varas Federais do Distrito Federal.

Apesar dessa normatização estabelecida pela PGF, a ANVISA ao examinar um pedido de patente faz o exame dos critérios de patenteabilidade quando a patente em questão é de interesse para o SUS. Além disso, embora o exame dos pedidos de patente seja conduzido sob a mesma disposição legal, a ANVISA adota uma posição divergente da posição adotada pelo INPI. A atual política da ANVISA é contrária à concessão de invenções de seleção e de segundo uso médico, por exemplo.

Consequentemente, uma invenção de seleção na área farmacêutica que estiver incluída dentro das políticas de interesse do SUS muito provavelmente não receberá a prévia anuência da ANVISA.

Esta divergência de entendimento entre o INPI e a ANVISA gera uma insegurança jurídica para os investidores em pesquisa, desenvolvimento e inovação na área farmacêutica. Atualmente, os titulares desses pedidos de patente estão tendo que recorrer à esfera judicial para ter um direcionamento sobre o que vai acontecer com seus casos. Para minimizar essa insegurança jurídica, é fundamental que a ANVISA ao examinar um pedido de patente atue nos limites de sua competência e não realize o exame de patenteabilidade, o qual é atribuição do INPI.

Recentemente, o INPI solicitou intervenção em uma ação judicial envolvendo um titular de um pedido de patente e a ANVISA para expor expressamente seu entendimento sobre o assunto. De acordo com o entendimento do INPI, os pareceres técnicos da ANVISA que negaram a prévia anuência do pedido de patente em questão deveriam ser impugnados, visto que nenhum risco à saúde pública foi identificado pela ANVISA em seus pareceres. O INPI concluiu que uma vez que tais riscos a saúde não foram identificados, não há respaldo legal para que a ANVISA negue a prévia anuência do pedido.

Esse posicionamento ativo do INPI em tal ação judicial reforça a normatização estabelecida pela PGF e aumenta as perspectivas de que o exame realizado pela ANVISA irá se limitar apenas ao seu campo de atuação, ou seja, de que a ANVISA não avaliará os requisitos de patenteabilidade de um pedido de patente.

Assim, é possível concluir que a prática da inovação e a estratégia de inovação incremental podem ser benéficas no setor farmacêutico, desde que não sejam utilizadas para prorrogarem a vigência de uma patente, mas empregadas para desenvolverem novos produtos de modo a proporcionar maior acesso aos medicamentos pela população.

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