Três anos após a Operação Lava-Jato revelar o esquema de corrupção na Petrobras, a estatal assinou acordo para pagar US$ 2,95 bilhões (R$ 9,5 bilhões) a investidores estrangeiros. Trata-se do maior acordo desse tipo já fechado por uma empresa estrangeira nos EUA. São seis vezes o R$ 1,475 bilhão que a petroleira recuperou até agora no Brasil. O pagamento deve afetar o balanço do quarto trimestre, e parte dos analistas prevê prejuízo. Com o fim da incerteza sobre o processo, as ações da Petrobras subiram 1,26%.

Mais de três anos após a Operação Lava-Jato ter revelado um esquema de corrupção na Petrobras, a estatal tenta encerrar um dos maiores capítulos financeiros envolvendo a disputa bilionária com investidores americanos. A companhia anunciou ontem que assinou um acordo para pagar US$ 2,95 bilhões (cerca de R$ 9,5 bilhões) aos estrangeiros que moviam uma ação coletiva (class action) na Justiça de Nova York alegando perdas financeiras com o pagamento sistêmico de propinas. O valor a ser pago pela estatal equivale a seis vezes o R$ 1,475 bilhão que já recebeu da Justiça — referente a valores desviados em operações irregulares entre executivos da estatal e fornecedores — e superior aos R$ 6,2 bilhões que declarou como perda no balanço de 2014 por causa da corrupção.

O acordo, anunciando na manhã de ontem pela Petrobras, foi bem recebido por analistas de mercado e agência de classificação de risco. Segundo eles, a estatal corria risco de ter de pagar uma indenização de cerca de US$ 10 bilhões. O valor proposto pela companhia é o maior já feito por uma empresa estrangeira nos Estados Unidos e o quinto maior no mercado americano. Fica atrás apenas de Enron (US$ 7,2 bilhões), Worldcom (US$ 6,1 bilhões), Tyco (US$ 3,2 bilhões) e Cendant (US$ 3,18 bilhões).

A Petrobras informou, em comunicado ao mercado, que o acordo "ainda será submetido à apreciação do juízo norte-americano e objetiva encerrar todas as demandas atualmente em curso e que poderiam vir a ser propostas por investidores em ações e bônus da Petrobras adquiridos nos Estados Unidos". Na prática, a companhia, ao fazer essa proposta, elimina o risco de um julgamento desfavorável na ação coletiva. Nos EUA, é comum os investidores entrarem com ações coletivas contra empresas quando percebem que foram penalizados. No caso da Petrobras, eles alegam que os contratos, inflados por causa do pagamento de propinas, teriam elevado artificialmente os valores dos títulos da Petrobras. Por isso, pedem reparação. A ação coletiva atual é fruto de cinco processos coletivos, que foram abertos a partir de 2014, mesmo ano do início da Lava-Jato.

OUTRAS 13 AÇÕES INDIVIDUAIS NOS EUA

A estatal informou que os US$ 2,95 bilhões serão lançados no balanço do quarto trimestre de 2017, o que, segundo analistas, pode levar a companhia a registrar prejuízo pelo quarto ano consecutivo. No comunicado, a Petrobras explicou que vai pagar o total em três parcelas: duas de US$ 983 milhões e outra de US$ 984 milhões. "A primeira parcela será paga em até dez dias após a aprovação preliminar do juiz, que não tem prazo legal pré-definido. A segunda parcela será paga em até dez dias após a aprovação judicial final. A terceira parcela será paga em até seis meses após a aprovação final ou 15 de janeiro de 2019, o que acontecer por último", explicou a companhia no comunicado.

Porém, a estatal poderá ter de arcar com novos passivos. Isso porque há ainda outras 13 ações individuais nos EUA movidas por quem comprou títulos da companhia entre 2010 e 2015. Esses processos foram abertos por investidores que não quiseram aderir a uma ação coletiva. Além disso, a Petrobras já fechou acordo em outras 21 ações individuais, que custaram US$ 448 milhões, valor já provisionado em seu balanço.

— A empresa conseguiu solucionar um de seus maiores passivos financeiros. O valor veio bem abaixo do que o mercado estava esperando. Por isso, foi positivo para a empresa, embora isso afete seus resultados em 2017 e indique que, em 2018, a companhia terá de continuar vendendo ativos para reforçar seu caixa — disse Rafael Passos, analista da Guide Investimentos.

Em nota a clientes, o BTG Pactual disse esperar um pagamento de até US$ 10 bilhões: "A expectativa do mercado era de uma variação muito ampla, mas que tinha números tão grandes como US$ 5 bilhões a US$ 10 bilhões. Essa sempre foi uma estimativa muito difícil de ser construída e uma fonte de incerteza. Então, a solução parece boa".

A Coinvalores também afirmou a clientes que, se o acordo for aprovado pela Justiça, eliminará o risco de o processo ir a julgamento, no qual a penalidade poderia ser mais agressiva.

A agência de classificação de risco Moody's afirmou que a posição de liquidez da Petrobras é adequada e que o pagamento do valor acordado da ação coletiva não é uma preocupação relevante. "Em 2018, a empresa deve gerar cerca de US$ 30 bilhões em caixa operacional e as despesas de capital devem ser de cerca de US$ 15 bilhões", disse a agência em nota.

Desde que o esquema de corrupção veio a público, a Petrobras entrou em crise financeira e teve de fazer uma série de ajustes para contornar seu endividamento, que chegou a superar os US$ 100 bilhões, tornando-se a maior dívida corporativa do mundo. Para fazer caixa, afetada ainda pela queda no preço do petróleo, a companhia passou a vender ativos e a buscar parceiros estratégicos. A meta é arrecadar US$ 21 bilhões até o fim deste ano. Além disso, a Petrobras tem 59 ações, a maior parte em conjunto com Ministério Público Federal e Procuradoria-Geral da República, contra pessoas e empresas envolvidas nos casos de corrupção. Elas representam um possível ressarcimento de R$ 41 bilhões.

— O acordo é positivo para a Petrobras e encerra uma incerteza jurídica. Por outro lado, novos passivos jurídicos podem vir a surgir. Como os resultados da Petrobras sempre vêm com fatores extraordinários, é difícil prever como esses US$ 2,95 bilhões vão se refletir no resultado, já que a companhia fez abertura de capital da BR Distribuidora — disse Roberto Indech, analistachefe da Rico Investimentos.

A advogada Alexandra Bellini, do Vinhas e Redenschi Advogados, destacou que foi importante a Petrobras fechar o acordo para encerrar a ação coletiva. Segundo ela, as leis americanas preveem um valor elevado de multa como forma de penalidade para a empresa:

— É muito incerto a quanto poderia chegar a indenização. Os custos do processo também são muito elevados.

Para ela, a Petrobras já sinaliza que não fará o mesmo acordo nas ações no Brasil quando ressalta que, apesar do acerto nos EUA, foi vítima da corrupção.

MULTA DE R$ 17 BILHÕES

Ontem, a companhia também recebeu uma multa de R$ 17 bilhões da Receita Federal referente ao não pagamento de Imposto de Renda, PIS, Cofins e Cide-Serviços sobre remessas ao exterior para pagamento de afretamento de embarcações em 2013. Para André Carvalho, sócio do Veirano Advogados, especialista nas áreas de petróleo e setor naval, a companhia, que tem ainda outros R$ 45 bilhões em disputas fiscais com o governo, deverá fazer uma provisão de R$ 700 milhões em seu balanço para arcar com a dívida tributária.

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